Pulsão de vida

Estudioso de temas como tragédia, melancolia e suicídio, o professor de Teoria Literária da Universidade de Brasília (UnB) Gabriel Pinezi organizou o primeiro Simpósio Internacional de Estudos Críticos Sobre o Suicídio: “O evento é uma tentativa de abrir espaço para investigar não só estatísticas, mas as diversas razões pelas quais pessoas podem cometer suicidio, além de dialogar com profissionais da saúde sobre o modo como pensam o fenômeno médico e social”.

Entre os dias 27 e 29 de novembro de 2024, no Auditório Esperança Garcia, da Faculdade de Direito da UnB, especialistas em antropologia, saúde, psicologia e literatura discutiram o tema de forma plural e crítica. Com abordagem interdisciplinar, o evento inaugurou modelo de discussão a respeito do suicídio no Brasil. Tabus, evolução de estudos, bem como desafios éticos e sociais, foram os principais assuntos tratados no simpósio.

“Um simpósio interdisciplinar sobre suicidologia não é comum, por ser mais discutido na área da saúde. Impressiona ver pessoas de outras áreas com perspectivas que essa bolha, muitas vezes, não considera. No caso da psicologia, é bom ter outros relatos e leituras que fujam desse eixo óbvio de discussão sobre um tema que é tão complexo”, disse a psicóloga palestrante e doutora em psicologia clínica e cultura pela UnB, Juliana Falcão, a respeito da experiência no evento.

Suicídio em perspectiva

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que mais de 800 mil pessoas tiram a própria vida por ano – uma morte a cada 40 segundos, com base em estimativas e registros de óbito fornecidos por países. A distribuição entre regiões é irregular: áreas subdesenvolvidas tendem a apresentar taxas superiores à média global.

Estudos da Universidade Estadual Paulista (Unesp) indicam que desigualdades, crises econômicas, situações de vulnerabilidade e formas de governo podem contribuir para aumento de taxas de suicídio. A pesquisa também aponta falta de suporte emocional e estigmatização de doenças mentais como agravantes do fenômeno.

“O suicídio não deve ser tratado apenas como questão médica. Violências sociais também impactam o sofrimento das pessoas. A proposta não é descartar a visão clínica, mas incluir questões estruturais que afetam percepções da própria vida. Não é possível quantificar o exato peso de cada fator, já que suicídio não segue uma lógica exata”, disse Thiago Nagafuchi, doutor em ciências pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP/USP) e pesquisador em suicidologia.

Desafios para prevenção

“Suicídio é assunto muito difícil e subjetivo e a ideação suicida é uma questão humana, que, de muito, não é falada. Tende a ser esquecido ou removido do discurso público, e há boas razões para isso, pelas quais é preciso ter cuidado. Mas falar sobre suicídio também é importante, tanto para quem sofre de ideação suicida, quanto para sobreviventes do suicídio”, afirmou Andrew Bennett, professor do Departamento de Literatura Inglesa da Universidade de Bristol, no Reino Unido, e palestrante do simpósio.

Um dos dilemas da abordagem do suicídio é tratamento midiático que impeça efeito de contágio. Cobertura responsável fortalece medidas preventivas e estimula estratégias como desenvolvimento de políticas públicas, apoio a redes de suporte emocional e formação de profissionais capazes de intervir em casos de risco.

Aluna do curso de Letras na UnB, Maria Serraninho foi ao evento interessada com o que seriam os três dias de palestras e debates. Sobrevivente de tentativa de suicídio, sentiu-se grata com o evento. “O simpósio foi bem direcionado ao público. Os palestrantes queriam nos ouvir também, entender a experiência de quem estava lá. Parecia que ninguém, em nenhuma posição, era detentor total de conhecimento. De forma muito natural, fiquei à vontade para falar o que passei. Me senti vista, humana, como há muito tempo não sentia. Acho que isso pode resumir o que o simpósio foi: lugar de discussão, mas também de acolhimento”, afirmou.

O Centro de Valorização da Vida (CVV) conta com especialistas disponíveis 24h, preparados para ouvir qualquer pessoa em sofrimento psíquico. Caso você precise de ajuda, ligue na linha de atendimento 188.

Clique aqui para acessar a cartilha de prevenção ao suicídio, feita pelo CVV.

Mariana Chagas, 18
Jornalismo
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