Existo sobre papel

 

Escrita (es.cri.ta) sf. 1 Forma de alento para aqueles que se sentem deslocados no mundo. 2 Arte de dispor palavras em sentido conjunto ou extrair delas isoladamente significado completo. 3 Atividade capaz de formalizar desde receitas de bolos aos grandes livros literários. 4 Paixão de infância, cuja funcionalidade era fugir da melancolia. 5 Possível carreira a longo prazo.

Tais definições tornaram a escrita parte de mim. Quando tinha sete anos criei poema para apresentação em festa natalina. Obtive algum reconhecimento de parentes pedagogos que incentivaram habilidade recém-descoberta, três frases acerca da importância de Jesus, as quais renderam como presente caderno decorado e canetas com cheiro de fruta, materiais apropriados para concretizar rotina criativa.

Preenchi e arranquei cada página, insatisfeita com tudo que punha no papel, mas gostava daquela sensação de me expressar sem represálias comuns direcionadas à criança tagarela. Após dois anos, decidi começar a ler exemplares mais complexos que gibis. O pequeno príncipe foi primeira tentativa de muitas malsucedidas, não conseguia criar hábito de leitura, por isso acrescentei dicionário à lista de estudos, na esperança de ampliar vocabulário enxuto. Funcionou em certa medida.

No terceiro bimestre da quarta série, precisei efetuar resumo e responder prova avaliativa acerca da obra literária O mistério da cidade-fantasma, de Marçal Aquino. Este livro alavancou interesse por textos diversos. Ao longo de 91 páginas, lidas tão rapidamente que geraram arrependimento, senti-me mergulhada em aventura sublime e a partir desse momento busquei leituras capazes de trazer o mesmo êxtase.

Identificar entusiasmo tanto no manuseio da caneta quanto na decodificação dos registros textuais de outras pessoas me deu coragem para fabricar narrativa fantasiosa. Em algum ponto desisti de prosseguir com projeto, embora tenha guardado todas as 49 folhas. Nunca voltei a lê-las ou quis retomar rascunho, talvez porque acredito que nenhuma ideia formulada por mim aos 12 anos vale investimento.

Socialização é desde os primórdios a maior dificuldade que encaro, mas colocar indivíduos no papel como personagens de histórias, nem sempre elaboradas, tornou mais fácil entendê-los. Quando não consigo interpretar emoções alheias, imagino universo onde isso se faça tangível. Controle, seja da ansiedade, seja dos acontecimentos que me rodeiam, essa é a razão pela qual escrevo, todos os dias, mesmo desmotivada. 

Sou admiradora de várias artes, como desenho, teatro, música, dança etc. Executo ambas com nível inferior ao básico. Entretanto, escrita vai além de um passatempo. Reconheço-me em cada palavra, como jamais vi no espelho. Escrever é para mim o método mais eficaz de expressão.

 

Iane Lima, 18
Audiovisual
Pular para o conteúdo